Faculdade Mario Schenberg

terça-feira, 30 de abril de 2013

Orientações básicas do tratamento fisioterapêutico na artroplastia do quadril.


Introdução
O quadril é a articulação proximal do membro inferior que tem como função orientá-lo em todas as direções no espaço, razão pela qual possui 3 eixos e 3 graus de liberdade. Os movimentos do quadril são realizados por uma única articulação, que é a coxofemoral, uma articulação tipo esferóide, bem encaixada. É dotada de uma menor amplitude de movimento compensada de uma certa forma pela coluna lombar, mas contrariamente ela é claramente estável, é a articulação mais difícil de ser luxada em todo o corpo. Essas características do quadril são condicionadas pela função de peso do corpo e de locomoção assumida pelo membro inferior. A artroplastia total do quadril em acetábulos deficientes foi sempre considerado problema de difícil solução, porém grandes reconstruções articulares começaram em 1962, quando John Charnley realizou pela primeira vez uma artroplastia de quadril utilizando um componente femoral metálico e um componente acetabular de polietileno de alta densidade e cimento ósseo acrílico auto-secante.
Um dos principais objetivos da artroplastia é o alívio da dor e a restauração da função articular, sendo sua principal indicação o tratamento da coxartrose em pacientes da 3ª idade.
Em nossa experiência, os diagnósticos mais comuns foram: coxartrose primária, necrose da cabeça do fêmur, artrite reumatóide, fratura do colo femoral, espondilite anquilosante entre outros.
Porém as próteses têm inúmeros problemas: quanto à dimensão da esfera protética; natureza das superfícies de contato, ligadas às questões do coeficiente de atrito, resistência ao uso; toxidade eventual conseqüente ao desgaste normal e, sobretudo pelo modo de ligação com o osso vivo, dado pela questão da fixação. Por isso as pesquisas sobre as próteses de quadril foram as que mais se desenvolveram e onde o número de modelos é maior. Consequentemente a recuperação funcional é objetivo de preocupação, pois o tratamento fisioterápico deve iniciar desde a fase pré-operatória que é uma fase fundamental para a evolução do tratamento. É nesta fase que o fisioterapeuta iniciará um programa de fortalecimento muscular, orientação para um bom posicionamento no leito, prevenção das complicações respiratórias e quanto às escaras de decúbito, prescrições de cadeiras de rodas e andadores, ao passarmos para o pós-operatório continuaremos com todo o protocolo fisioterápico de forma mais intensa e os cuidados nas posições deitado, de pé e sentado durante as quatro primeiras semanas.
Avaliação e tratamento fisioterápico na fase pré-operatória da artroplastia do quadril
Quando ocorre um trabalho de equipe, nós, fisioterapeutas, iniciamos um tratamento precoce começando no pré-operatório, desta forma proporcionaremos ao paciente informações de toda a sua recuperação funcional.
Na avaliação fisioterápica devemos observar o estado emocional e psicológico do paciente, como se encontra, tenso, deprimido, conformado com a situação, sua orientação quanto ao tempo e espaço verificando durante o contato com o paciente seu nível de consciência e a velocidade para a obtenção da resposta aos estímulos. Continuaremos com o exame cardio-respiratório para verificarmos a condição pulmonar através da ausculta pela presença do murmúrio vesicular ou ruídos adventícios determinando, portanto, a qualidade do aparelho respiratório. O exame motor deve ser iniciado precocemente e será avaliada sua força muscular, amplitude de movimento, coordenação e sensibilidade do paciente.
O tratamento fisioterápico na fase pré-operatória deve ter uma função preventiva que seria prevenir as complicações respiratórias, motoras e evitar as escaras de decúbito. Sendo assim iniciaremos da seguinte forma o tratamento:
1. Cinesioterapia motora dos membros inferiores associados à respiração profunda e lenta, procurando expandir o máximo o pulmão e manter as articulações preservadas, pois no pós-operatório imediato o paciente tende a ficar confinado a leito e ao quadro álgico presente;
2. Posicionamento adequado no leito para os membros inferiores devendo manter as pernas abduzidas, porque os movimentos de flexão, abdução, rotação interna ou externa acentuada podem luxar a prótese, evitando também a flexão da articulação coxofemoral acima 45º de como medida preventiva para a luxação;
3. Cinesioterapia motora para todos os membros inferiores procurando potencializar a musculatura abdutora do segmento a ser operado;
4. Manutenção das articulações do segmento que vai ser operado evitando assim bloqueio do joelho e tornozelo desnecessariamente;
5. Fortalecer o membro oposto ao que vai ser operado; deve ser bem trabalhado, pois ele é quem vai suportar, após a cirurgia, grande parte do peso corporal;
6. Orientação para a mudança de decúbito, pois o paciente não pode ficar em decúbito lateral para o lado da cirurgia; orientar o posicionamento correto na cama e a transferência para uma mesa ortostática ou, caso não haja a mesa ortostática, facilitar a mudança de deitado para sentado e posteriormente em pé;
7. Orientar sentar em cadeiras e vasos sanitários; o paciente deverá manter a perna que será operada em extensão, sentado com a região lombossacra na cadeira evitando assim uma angulação exagerada na mesma;
8. Orientação e prescrição quanto ao uso de muletas ou andador;
9. Orientar como será a reeducação de marcha, devendo ser iniciado quase sempre um andador; manter as pernas abduzidas, evitando girar o segmento operado em rotação interna ou externa;
10. Iniciar contrações isométricas de quadríceps e glúteos;
11. Flexão e extensão de tibio-társica com exercícios ativos livres/resistidos, assim como movimentos de inversão e eversão;
12. Quanto mais esclarecido o paciente estiver, mais fácil será sua recuperação e, desta forma, evitaremos uma série de complicações.
Fatores que contribuem para luxação e subluxação do quadril
A posição errada de um ou ambos os componentes da artroplastia, o encurtamento do fêmur, fraqueza dos músculos abdutores, avulsão do grande trocânter, adução excessiva e flexão do quadril no período pós-operatório inicial acima dos limites de angulação segura.
Tipos de próteses mais usadas
* Charnley e Muller – são próteses utilizadas nas artroplastias totais, onde é substituído o componente acetabular e femoral.
* Thompson e Bipolar – são próteses utilizadas nas artroplastias parciais, onde apenas é trocado o componente femoral preservando o acetábulo.
Considerações sobre a utilização ou não do cimento ósseo
Drumond & Brasil (1990), acreditam que há tendência hoje a utilizar também componentes não-cimentados em revisões, pois o uso do enxerto para uso do acetábulo tem sido considerado superior ao cimento, visando preencher a cavidade, como Charnley inicialmente preconiza ou os anéis e telas sugeridos por Eichker e Muller.
Oliveira & Barros (1992), descrevem que no pós-operatório imediato, os pacientes que receberam prótese sem utilização de cimento, permaneceram com coxim abdutor por uma semana. A marcha sem apoio foi liberada tão logo o paciente conseguiu auto-sustentar-se e a carga total, liberada após 90 dias.
Nos pacientes que receberam prótese com cimento, foram iniciados exercícios isométricos no pós-operatório imediato e carga total permitida após 10 dias.
Segundo minha experiência, em relação à recuperação funcional, as próteses cimentadas são melhores, pois permitem ao paciente uma carga precoce a partir do 2º ou 3º dia de pós-operatório; já a não cimentada terá que aguardar a consolidação, o que pode ocasionar complicações no pós-operatório que já possui uma alta taxa de mortalidade na 3º idade, em decorrência de complicações respiratórias, escaras de decúbito, contraturas musculares e etc.
Tratamento fisioterápico pós-operatório
A) Esta segunda fase inicia-se no dia seguinte do pós-cirúrgico, permitindo assim que o paciente descanse do próprio ato cirúrgico e anestesia;
B) Deve ser colocado um coxim triangular, caso não tenha, um travesseiro serviria para manter ambas as pernas em abdução;
C) Evitar os movimentos de flexão acima de 45º, adução e rotação interna e também a rotação externa, os quais podem luxar o quadril;
D) Proporcionar mudança de decúbito para prevenir escaras, com o máximo de cuidado para que não haja o deslizamento do lado operado, o que irá favorecer a adução e conseqüentemente a luxação da prótese;
E) O paciente não deve ser colocado sobre o lado operado;
F) A cinesioterapia respiratória deve ser intensificada, pois agora o paciente está mais preso ao leito;
G) A patela deve ser mobilizada, assim como o joelho, deslocando o paciente de modo que ele fique em diagonal na cama e com a perna do membro operado para fora, mantendo o quadril imóvel;
H) Fortalecimento muscular: no caso dos abdutores, podem ser usados patins para diminuir o atrito no leito, isometria de quadríceps e glúteos. Colocaremos o paciente em diagonal no leito, mantendo a coxo femoral em posição neutra permitindo que o joelho operado fique pendente e realizaremos exercícios isotônicos para flexão e extensão de joelho passiva, assistida, livre ou resistida, dependerá apenas das condições do paciente;
I) Nos primeiros dias o paciente é posto na posição ortostática através de uma mesa ortostática, duas vezes ao dia;
J) No terceiro dia ele é colocado de pé com ajuda de um andador, e progressivamente deambula com uma marcha de carga parcial onde o paciente divide o peso de seu membro operado com as muletas ou andador, lembrando que o membro operado deve ser mantido em abdução e o pé em posição neutra;
K) No quarto dia o paciente poderá sentar em uma cadeira na posição semi-ereta, porém o quadril não deve ser fletido mais do que 45 graus; ele sentará mais propriamente sobre o sacro e a região lombar;
L) Do quarto dia até a alta hospitalar, manteremos estas atividades com aumento gradativo, sendo mais intensos em relação à amplitude e incentivados e realizar com mais freqüência aumentando sua resistência e força muscular.
Cuidados a serem tomados após a alta hospitalar durante as primeiras 4 semanas
1) Paciente deitado
Manter as pernas abertas, não dormir sobre o lado operado, colocar dois travesseiros entre os joelhos ou coxim triangular feito de espuma; quando for virar para o lado não operado; pode se utilizada uma tipóia para manter tracionado em abdução.
2) Paciente sentado
Não sentar reto na cadeira, pode sentar somente inclinando o tronco para trás com a região lombossacra; evitar cruzar o membro afetado sobre o lado não operado, não sentar em cadeiras baixas, não cortar as unhas.
3) Paciente em pé
Evitar girar o membro operado sobre ele mesmo; pode dobrar o joelho operado quando andar, pois não vai alterar no aumento da flexão do quadril; utilizar muletas ou andador, colocando carga progressiva sobre a extremidade operada; andar com as pernas abertas.
4) Paciente no banheiro
Não tomar banho de banheira, não pegar objetos no chão, só tomar banho no chuveiro em pé, evitar o uso de tapetes e a presença de animais que possam escorregar, tropeçar e provocar tombos.
5) Orientação AVDs
Abster-se do trabalho e das atividades sexuais; não dirigir veículos; qualquer alteração no quadril, dor torácica, edema nas pernas, drenagem sanguínea ou purulenta no quadril, deve ser notificada.
* Normalmente os pacientes podem voltar às atividades sedentárias após 4 a 6 semanas, e, após 3 meses, poderão retornar às atividades que exigem em pouco de flexão lombar e dos joelhos.
Conclusão
É necessário compreender bem o mecanismo das artroplastias do quadril, pois nem sempre os tratamentos seguem a mesma linha de conduta, o que implicará em modificações e adaptações de acordo com cada paciente e complicação que por ventura tenha apresentado.
Quanto ao tratamento fisioterápico quanto mais precoce for a atuação do fisioterapeuta, mais rápido será a recuperação funcional do paciente, sem complicações para os componentes cirúrgicos, motores e respiratórios, para uma adequada reabilitação as atividades de vida diária e profissionais.

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